sábado, 21 de outubro de 2006

terça-feira, 17 de outubro de 2006


(à c.s. que me diz poesia ao ouvido em tom de abraçar)






















"pareces um bambu ao vento...
flutuas por todos os lados
mas permaneces tal qual uma árvore
que sabe onde é o seu lugar..."


(querida - sou tão igual a ti!!!
sou feita de não saber e não ter onde ficar...
sou feita de naufragar e continuar a navegar
nesta terra instável, tal qual o grande mar...)

sente um abraço forte amiga!
obrigada pela poesia da vida, muito tua, muito nossa...
muito de morrer e ressuscitar!



(foto:zomik - "between trees")

e fico assim rendida
quando a mim vens de mansinho
baloiçar-me os pés frios
nas águas de outono...

e fico assim rendida
mãos na cabeça tão frágil
pés num chão de resvalar...

e assim fico rendida
mar imenso
céu em mim

talvez um dia em ti
no azul possa mergulhar*....








*voar




(foto: artur k. - "inspired- the hours")

quinta-feira, 12 de outubro de 2006



ando cansada sabes...

há anos que me deito nesta banheira cheia de mim

deste sabor a sal que me conserva submersa

quase ilesa quando saio por enxugar

não te posso prometer o mar

porque estou confinada a esta banheira

limite do que sou

não tenho águas limpas que te deem força

ou um rio imenso a correr constante

sem o variar das estações

não te vou enganar...

mais não posso fazer do que molhar-te ainda mais

do que agitar as águas aparentemente calmas

da banheira

desta banheira branca

estou cansada sabes...

precisaria de coragem para abrir o ralo

deixar a água sair lentamente

cabeça

pescoço

ombros

barriga

pernas

últimas gotas a sairem-me pelos pés

até ficar vazia

seca

e depois...

depois esperaria que o ar me comovesse para além da pele

que as gotas evaporassem em redor de mim

e aí deixaria que fosses tu a abrir a torneira inchada

ferro preso da memória

ando cansada sabes...

VOU ABRIR O RALO!!

VEM!!!

(foto: marilia campos - "sem título")

quarta-feira, 11 de outubro de 2006


não há homens sem medo

pode é haver homens que apenas têm o medo de ter medo...


















(imagem: hans bellmer "la toupie"-1956 - óleo sobre cartão)
colecção berardo

terça-feira, 10 de outubro de 2006



o meu silêncio diz-te o que quiseres ouvir...

o teu silêncio diz-te o que não quiseres ouvir...





(desculpem-me mas eu não poderei nunca querer o querer...)



(foto: sean mcclintoch: "silence")

my story about Story










a história começa com um simples não escutar...

antes do mundo ser isto que somos
existiam os anjos que embalavam os homens nos seus regaços
enrolados no sargaço
entre a terra e o mar...

porém os homens deixaram de escutar
(um dia deixaram de se escutar)

e passado tanto tempo
tempo de muito calar
veio um anjo que não sabia bem ao que vinha
e emergiu de águas profundas

e tinha medo de ser anjo
tinha medo de ser o anjo

e conheceu um homem que nunca tinha chorado a morte dos seus
e um outro que tinha medo de escutar o coração das palavras que lhe ferviam lá dentro
e a irmã dele que ia ter sete filhos e não sabia
e havia uma mulher que decifrava histórias vindas de uma lingua estranha
e a mãe dela que só as contava a "crianças-homem"
(será que ainda existem? será?)

e havia de facto uma criança

e um grupo que fumava charros e falava do Luther King de vez em quando
e um homem sem originalidade que falava da falta de originalidade dos outros
e cinco mulheres histéricas que gritavam ao mesmo tempo
e um homem que não sabia que os seus olhos podiam salvar alguém
e outro que calado que ficava parado em entretém
e uma mulher com esperança, de que a esperança voltasse

e chegou o anjo
e o anjo caiu

não sobre as águas que lhe deram vida
mas sobre a terra onde por vezes morremos antes de morrer


não podemos andar escondidos
não podemos esconder os anjos por muito tempo...

e foi preciso que todos se calassem
para escutarem mais alto e mais fundo
a voz do anjo calado
a voz que ninguém antes tinha escutado

e foi preciso o anjo
o anjo a morrer, tão puro...

para que o homem chorasse
e um outro gritasse as palavras que o iam matar
e só iria ver dois dos sete filhos da sua irmã
e a mulher que decifrava histórias calou-se para as escutar
e a mãe dela lembrou-se de uma criança a brincar

e a criança era a única que sabia do que estava a falar

e o grupo olhou em redor e soube amar
o homem sem originalidade ficou perdido e não soube explicar
e as cinco mulheres histérias ficaram só a olhar
(mãos unidas, tão fortes...)
e o homem salvou com os olhos aquela que o ia salvar
e o homem calado pela primeira vez falou
e a mulher agarrada à esperança, esperou... esperou...

e só na morte o anjo conseguiu regressar
ao mar de onde viera
ficando na memória da terra
que veio a medo resgatar


estou a falar-vos de uns olhos
ou de um gesto
ou do timbre de uma voz
ou de um simples acenar

nem sequer sei bem do que estou a falar
só este sentir cá dentro...

não podemos andar escondidos
não podemos esconder os anjos por muito tempo...

anjos vestidos com paramentos humanos
anjos com sabor a (a)mar...

(foto: a actriz Bryce Dallas Howard no filme "A Senhora da Água")

segunda-feira, 9 de outubro de 2006


when i'm over you
and when you are over me
as we go on this journey apart and alone
just another daydream
just another daydream
just another day
just another day to dream
you can now unlock the sadness
if you ever feel the need
don't you know what turns the planet?
sends those shipwrecks back to sea?
healing begins when the wounds have been closed
caution the flowers, these buds may not show
just another daydream
just another daydream

when i'm over you
and when you are over me

will ours ghosts be together?
so peaceful... so free...
just another daydream
just another daydream

fading in the moonlight
fading in the moonlight
i don't see the world through cold (...) eyes.


(música e letra: perry blake/sabiu - when i'm over you - in, songs for someone
foto: fernando lemos - a sós/areia e vertigem 1949/52-05)

sexta-feira, 6 de outubro de 2006

o sal da terra
















Desconfia daqueles que veneram. Expulsa de tua soleira os devotos. Não admitas a teu convívio os lábios reverenciais. Com as giestas da última primavera (eram abundantes, lembras-te?), arma a vassoura que trarás sempre contigo. Busca o desprezo, de ti e das coisas, com a mesma infinda minúcia com que outros apenas se buscam, na composição confusa de seus ecos.

Tu, porém, se é a poesia que procuras, cultiva a indiferença absoluta pela poesia. Não te deslumbre a cantilena dos oficiais, nem penses nunca que encontraste a poesia no exaltado martelar dos artífices. Afasta-te dos que repetem os nomes do poema como avulsos consolos, e não como íngremes entradas que a própria montanha estabelece. A poesia passa ao largo de tudo: é um mendigo que chegou a más horas e partiu antes de todos; é um grito que nos sobressalta o sono e não sabemos se irrompeu do mundo exterior ou de dentro dos próprios sonhos; é uma embarcação que pensas ter vislumbrado apenas na névoa e da qual nem coragem tens de falar. Em caso algum te deixes tentar pelos fáceis modos da vizinhança quando a distância é o nó irredutível da comunhão verdadeira.




josé tolentino mendonça
(foto:autor desconhecido - "manicomio de conxo")

quarta-feira, 4 de outubro de 2006





há coisas que se vão como a luz ao final do dia
...e sempre esta espera interminável de ti...







(foto: zomik - "gone")