domingo, 18 de novembro de 2007

um caminho de palavras


"Sem dizer fogo - vou para ele. Sem enunciar as pedras, sei que as piso - duramente, são pedras e não são ervas. O vento é fresco: sei que é vento, mas sabe-me a fresco ao mesmo tempo que a vento. Tudo o que sei, já lá está, mas não estão os meus passos nem os meus braços. Por isso caminho, caminho, porque há um intervalo entre tudo e eu, e nesse intervalo caminho e descubro o meu caminho.

Mas entre mim e os meus passos há um intervalo também: então invento os meus passos e o meu próprio caminho. E com palavras de vento e de pedras, invento o vento e as pedras, caminho um caminho de palavras.

caminho um caminho de palavras
(porque me deram o sol)
e por esse caminho me ligo ao sol
e pelo sol me ligo a mim

e porque a noite não tem limites
alargo o dia e faço-me dia
e faço-me sol porque o sol existe

mas a noite existe
e a palavra sabe-o"






antónio ramos rosa
de sobre o rosto da terra, 1961




(gosto de pensar que este poema me descreve)




(foto:jeff hahn - "ocean dream")

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