terça-feira, 27 de junho de 2006


Nunca te pedi nada a não ser o abraço de encontro ao teu peito frágil
poço da memória de que a vida é breve
pele encovada do tempo de não saber...

eterno efémero...

não me devias ter pedido em casamento, nem me devias ter dito que querias o meu ventre prenhe de um filho teu...

não, não devias...
(não podias ter feito isso... o não fazer...)

sabes que acredito sempre nas palavras...
que as carrego na ponta dos dedos com que afago o teu peito nu
e nele escrevo estórias...
(sim estórias com "e" só para te irritar, estórias inventadas no jogo das palavras que me deste, não tenho mais nenhumas e são tão poucas)

não tenho tempo
sabes que morri no dia em que te acreditei
no dia em que me penetraste a carne como se fosse uma coisa tua
e disseste que tinhamos que fugir para sermos nós

não, eu não quero fugir
eu não quero ser tua
nem de ninguém
nem de mim...

nunca casarei
nunca partilharei contigo da aliança inteira de ser
porque não sou nada

não, também não terei filhos
nem enteados
nem adoptados

o meu útero secou
e a vida amestrada que levo acabará em breve

descobri que o silêncio me protege de ser
e não me apetece ser o que quer que seja nesta terra infértil...

nem tua esposa
nem tua mãe
nem a mãe de quem quer que seja

não me apetece:
lembrar palavras
dizer palavras
pronunciar palavras
castrá-las em mim...

não, não me apetece nada

não quero o querer
não quero nada
só quero a ausência de mim...

(de me querer assim, de te querer assim tanto
AII!! eu não posso querer o querer, não posso pois não?!)

de ti.... só queria o abraço ao teu peito frágil e nu
para conseguir mergulhar nesse poço informe
e morrer afogada
nessa água que fizeste um dia brotar de mim...

deste nada que sou
(não quero ser nada... cala-te para sempre sim?)

2 comentários:

Kisa disse...

coisas simples, gestos vagos que preenchemos com significados, os mesmos que talvez damos às palavras sempre que as mesmas se impõem. a vida seria tão mais fácil se bastasse um olhar, um sorriso, o silêncio... mas teimamos em preencher as ausências, em silenciar os silêncios com o que pode ser hoje e amanhã já não é... porque amanhã o vento já não sopra de norte mas de sul e o sol já não aquece as nossas entranhas da mesma forma que hoje o faz... porque amanhã o abraço de segurança junto a um qualquer peito poderá não ter o mesmo sabor que tem hoje...

... em pó te tornarás e o que é a vida senão o pó que nos tornamos a cada dia?

Abraço apertadinho...

Licínia Quitério disse...

Lindo, Sophia. E dolorooooso...
Quando escreves assim não te apetece chorar? Como se fosse tinta para as teclas.
Beijos.
Licínia